“O processo de agregação de valor deve estar totalmente ligado à necessidade e visão do consumidor”, afirma Breno Mesquita, diretor da Faemg
Minas Gerais é o maior produtor nacional de café. Com mais de um milhão de hectares plantados, o Estado é o responsável por aproximadamente 50% da safra brasileira e dois terços da produção total de café arábica. Além disso, o café é o principal produto de exportação do agronegócio mineiro e é vendido para mais de 60 países do mundo. A maior parte do parque cafeeiro de Minas Gerais encontra-se nas regiões Sul e Centro-Oeste do Estado, com área de mais de 500 mil hectares em produção, metade da área do Estado. Em segundo lugar vem a região compreendida pelas Matas de Minas, Jequitinhonha, Mucuri, Rio Doce, Central e Norte - que detêm em torno de 34% da área em produção de café do estado. Os 16% restantes encontram-se nas regiões do Triângulo Mineiro, Alto Paranaíba e Noroeste do Estado.
Segundo a Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA, as lavouras de café em áreas com declividade acima de 25%, a chamada cafeicultura de montanha (assim denominada por sua característica de relevo muito acidentado e semelhanças tecnológicas na condução da lavoura), ocupam boa parte do estado de Minas Gerais, respondendo por cerca de 70% da cafeicultura mineira. O Sul de Minas responde por metade dessa produção, com 155 municípios e mais de 67 mil produtores; e as Matas de Minas, em conjunto com a Chapada de Minas, representam os demais 30%, contando com mais de 100 municípios, 230 mil hectares e mais de 100 mil famílias envolvidas na produção. Mesmo sendo dominante no Estado e tendo boa produtividade e qualidade, a cafeicultura de montanha mineira vem perdendo competitividade. Pesquisas desenvolvidas no âmbito do Consórcio Pesquisa Café, que neste mês de março completa 16 anos de criação, podem contribuir para tornar viável a cafeicultura da região.
Em entrevista à Embrapa Café, o diretor da Federação da Agricultura e Pecuária de Minas Gerais - Faemg, Breno Mesquita, fala do panorama geral da cafeicultura em Minas Gerais, potencialidades, desafios e expectativas para 2013, além do papel da pesquisa na solução de problemas atuais enfrentados pelos setores de produção e comercialização.
Embrapa Café: Qual é a missão institucional da Faemg no que concerne ao setor cafeeiro?
Breno Mesquita: A Faemg representa os produtores de café de todo estado, defendendo os interesses políticos, econômicos e sociais da categoria. O Sistema Faemg tem como entidades integrantes a própria Federação, que atua nas instâncias governamentais e institucionais em busca do desenvolvimento do setor; o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural - Senar, que promove a formação e a capacitação dos trabalhadores, produtores rurais e suas famílias; e o Instituto Antonio Ernesto de Salvo - Inaes, que estuda os problemas e propõe soluções para a agricultura e pecuária, e os Sindicatos dos Produtores Rurais, representantes da categoria nos municípios.
EC: Quantos produtores de café são representados pela Federação no Estado de Minas Gerais?
BM: Atualmente a Faemg representa 379 sindicatos rurais. Mais de 400 mil pequenos, médios e grandes produtores mineiros são beneficiados pelas ações institucionais do Sistema Faemg, parte integrante do Sistema Patronal Rural, que tem como entidade líder a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
EC: É possível traçar um perfil predominante desses cafeicultores representados pela Federação para cada região produtora do Estado?
BM: De acordo com o estudo de Caracterização da Cafeicultura de Montanha do Estado de Minas Gerais, publicado pelo Inaes em 2010, as regiões Sul e as Matas de Minas são denominadas ‘Região de Montanha’ por suas características de relevo muito acidentado e semelhanças tecnológicas na condução da lavoura. Essa região corresponde a aproximadamente 70% da produção de café do estado de Minas Gerais, em mais de 220 municípios. Os outros 30% são produzidos no Cerrado e Chapada de Minas.
EC: Mesmo sendo dominante no estado e tendo boa produtividade e qualidade, sabe-se que a cafeicultura de montanha mineira vem perdendo competitividade. O alto custo da produção gerado pela impossibilidade da mecanização e o peso das obrigações geradas pelo uso de intensa mão-de-obra são responsáveis por essa desvantagem no mercado. Como avalia essa situação?
BM: De fato, devido à grande necessidade de uso de mão-de-obra frente à impossibilidade de mecanizar maior parte das operações nas regiões de alta declividade, a maior dificuldade dos produtores é mecanização da lavoura, que possibilitaria a diminuição do custo de produção.
EC: Na ótica da Faemg, quais medidas poderiam ser implementadas pelos governos federal e estadual para mitigar as dificuldades e desafios da cafeicultura de montanha?
BM: Nesse quesito, a importância da Embrapa e suas instituições parceiras é fundamental. Como exemplo, posso citar a importância das instituições de pesquisa unidas para a elaboração de proposta para aumento da competitividade da cafeicultura de montanha. O documento foi apresentado na reunião do Conselho Deliberativo da Política do Café – CDPC realizada último dia 28 de fevereiro no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – Mapa, em Brasília-DF. Se colocada em prática, teremos uma realidade muito diferente da atual, proporcionando aos produtores garantia de competitividade e apresentando ao mundo cafés de excelente qualidade e custo compatível com a peculiaridade da região.
EC: Em face do crescente aumento da produção do café no mundo (última estimativa da Organização Internacional do Café – OIC aponta safra de mais de 144 milhões de sacas, com tendência de crescimento), quais os caminhos para garantir remuneração justa aos produtores do Brasil?
BM: Vejo a agregação de valor ao produto por meio de reconhecimentos como Indicação Geográfica – IG e suas modalidades (Denominação de Origem – DO e Indicação de Procedência – IP), certificações e sustentabilidade como formas de conquista de mercado e de melhoria da remuneração para os agentes da cadeia produtiva. Isso com a condição de que a produção seja resultado de aumento de eficiência produtiva. Outro ponto é que a demanda mundial tem crescido em maiores proporções que a oferta.
EC: O consumo de café no Brasil na última década, segundo a Associação Brasileira da Indústria do Café – Abic, vem crescendo sistematicamente a ponto de se esperar que o Brasil, nos próximos três ou quatro anos, supere o consumo verificado nos EUA, que é o maior consumidor em nível mundial. Pergunta-se: o setor produtivo brasileiro está se beneficiando desse crescimento?
BM: Acredito que de uma forma ou outra o setor produtivo se beneficie das evoluções do mercado. O aumento do consumo pode ser por meio da conquista de novos consumidores de café ou com a diversificação das bebidas feitas com o produto e o incentivo à adoção de novos hábitos de consumo. Parte dos ganhos com o crescimento do consumo fica na indústria - que agrega valor ao produto com a torra, moagem, produção de bebidas com café, café em cápsulas, sachê, entre outras formas. Para que o produtor seja cada vez mais beneficiado com o aumento do consumo, precisa se diferenciar. Isso se faz, por exemplo, por meio de investimento em qualidade, sustentabilidade, rastreabilidade, transparência, certificações, reputação pela tradição da produção de café etc.
EC: E essa necessidade de diferenciação é um reflexo do novo perfil do consumidor, cada vez mais exigente. De que forma o setor produtivo deve aproveitar esse novo cenário de consumo?
BM: A produção de café de forma sustentável resulta em melhor gestão da propriedade e consequente redução do custo de produção. Além disso, o resultado pode vir como prêmio pago pela saca do café certificado. A rastreabilidade, por seu turno, antes de gerar transparência ao consumidor, permite que o produtor controle cada talhão de sua propriedade. Sendo assim, vejo as novas exigências dos consumidores como benéficas para o mercado. Acima de tudo, o produtor precisa se conscientizar de que é um empreendedor. Muitas vezes, terá que investir para ver resultados, como aumento de eficiência produtiva, redução dos custos de produção e valorização do preço do produto no mercado. Contudo, não adianta o produtor investir em uma certificação esperando agregação de valor ao produto sem que haja um reconhecimento e valorização pelo consumidor. O processo de agregação de valor deve estar totalmente ligado à necessidade e visão do consumidor, pois é ele quem paga mais ou menos pelo produto. Então, acredito na necessidade de desenvolver marketing interno e externo dos Cafés do Brasil e mostrar seus diferenciais, de forma que o consumidor possa realmente valorizar esses produtos, recompensando o valor investido pelo produtor. Além disso, a demanda por qualidade, sustentabilidade e reputação fazem o setor produtivo buscar cada vez mais eficiência produtiva por meio de inovações tecnológicas, renovação do parque cafeeiro, cuidados na pós-colheita, utilização de irrigação e consórcios com outras culturas, o que aumenta a competitividade perante os demais países produtores.
EC: Por falar em inovação tecnológica, a respeito da contribuição do Consórcio Pesquisa Café, criado em 1997, quando o Brasil possuía 2,3 milhões de ha de área cultivada com produtividade média de 12 sacas/hectare e produção de 27,5 milhões de sacas. Hoje, dezesseis anos depois, com praticamente a mesma área, a produtividade saltou para 24 sacas/ha e a produção para 50,8 milhões de sacas, segundo a Conab. Como interpreta esses dados?
BM: A pesquisa, não só em café, mas em todas as culturas é fundamental. Nesse ponto, o trabalho do Consórcio e das instituições que dele fazem parte é impecável. Pode-se dizer que essa parceria de instituições de ensino, pesquisa e extensão é a grande responsável por esse salto tecnológico, inserindo o Brasil na vanguarda mundial da pesquisa de café.
EC: Das tecnologias desenvolvidas pelas instituições participantes do Consórcio Pesquisa Café que foram incorporadas pela lavoura, quais delas considera terem sido especialmente positivas para o setor produtivo do café?
BM: As tecnologias geradas pelo Consórcio, como dezenas de cultivares de café arábica e conilon resistentes às principais pragas e doenças do cafeeiro e adaptadas a determinadas condições climáticas vêm melhorando a qualidade dos frutos e incrementando significativamente a produção e a produtividade. Podemos destacar ainda outras tecnologias, tais como as de preparo de solo, nutrição de plantas, manejo integrado de pragas, reaproveitamento de água residuária no processamento via úmida de café secagem e armazenamento de grãos. Cabe destacar também as tecnologias de irrigação de café no Cerrado mineiro, entre outras.
EC: Na perspectiva da Faemg, quais focos/temas da pesquisa ainda precisam ser desenvolvidos pelo Consórcio Pesquisa Café para oferecer soluções tecnológicas que amenizem os efeitos das crises cíclicas da cafeicultura?
BM: A mecanização da cafeicultura de montanha e a agricultura de precisão.
Consórcio Pesquisa Café - Coordenado pela Embrapa Café, reúne instituições de pesquisa, ensino e extensão localizadas nas principais regiões produtoras do País. Seu modelo de gestão incentiva a interação das instituições e a otimização de recursos humanos, físicos, financeiros e materiais. Foi criado por dez instituições: Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrícola - EBDA, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Embrapa, Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais - Epamig, Instituto Agronômico - IAC, Instituto Agronômico do Paraná - Iapar, Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural - Incaper, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento - Mapa, Empresa de Pesquisa Agropecuária do Estado do Rio de Janeiro - Pesagro-Rio, Universidade Federal de Lavras - Ufla e Universidade Federal de Viçosa - UFV.
Gerência de Transferência de Tecnologia da Embrapa Café
Texto: Carolina Costa - MTb 7433/DF e Flávia Bessa - MTb 4469/DF
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